#BRUTO- CAPÍTULO 3 - Faíscas

05/03/2018

Carolina Oliveira


O homem à minha frente é bem mais alto que eu, com meus respeitáveis um e cinquenta e cinco, mas eu "crescia" dez ou quinze centímetros em segundos, bastava calçar um dos meus maravilhosos saltos, o que era um desperdício no meio daquele mato, mas salto fino era algo de que eu não abria mão. E, perto dele, eu me senti pequena, mas não intimidada!
Será que ele sabia que já haviam inventado roupas? E água e sabão? O homem fedia a álcool, sexo e perfume barato. Assim que pronunciei meu nome completo, vi o riso que se formara no canto de seus lábios desaparecerem por completo.
A tensão entre nós é quase palpável.
- Você. Fala. Minha. Língua? - questionei pausadamente.
O peão deu dois passos na minha direção e pegou um dos pedaços de bolo colocando-o inteiro na boca. Ele chupou os dedos e passou a mão suja no jeans que parecia mais sujo ainda.
- Está perdendo seu tempo, moça - retrucou sem pressa, depois de engolir o bolo.
Ele se virou e saiu andando, me deixando plantada ali, como uma idiota. À medida em que ele se afastava, pude ver marcas de arranhões em suas costas, marcas roxas fracas por seus bíceps e tríceps.
- Onde você vai? - gritei antes dele desaparecer por uma porta mal pintada.
Mas que filho da mãe!
Nunca ninguém havia me deixado falando sozinha. Saí pisando duro e meu salto afundou no vão de uma das tábuas daquele piso de madeira caindo aos pedaços. Por pouco, não caio de quatro, espatifada no chão.
Eu estava naquele maldito lugar há menos de duas horas e já odiava tudo ali, o cheiro, a lama, a bosta da vaca em que atolei meu lindo salto Louboutin.Grunhi de raiva e me recompus. Bati à porta com toques firmes o suficiente para me fazer ser ouvida e sufoquei um grito quando uma larva de cupim branco veio grudada na minha mão.
Ahhhh, que nojo!
- Tudo aqui está se decompondo - resmunguei enquanto procurava na bolsa um vidrinho de álcool gel e lenços umedecidos para limpar minha mão. Eu sei que, quando a minha empregada não vai, as baratas tomam contam conta da minha cozinha, mas pelo menos elas têm a decência de se esconder quando eu apareço.
Depois de me limpar, guardo tudo na bolsa e passo o lenço no local onde vou bater novamente.
- Esse peão só pode ser surdo.
Bato mais uma vez e a porta abre sozinha. Eu o fuzilo com o olhar, mas cubro o rosto com as mãos ao ver que ele está como veio ao mundo. Completamente nu.
- Eu já disse que não vou embora enquanto não conversarmos - rebati com firmeza, sentindo gotas quentes de suor escorrerem pelo meu corpo. Deus, que calor! Ouvi os passos dele se aproximando sem nenhum pudor. Engoli em seco.
- Não vai vestir uma roupa? - bradei, sentindo o rosto e o corpo inteiro esquentarem de raiva.
- Não. Acho que hoje vou passar o dia inteiro nu. Algum problema com isso? - ele provocou, sendo que não custava o maldito enrolar a porcaria da toalha que está em seu ombro na cintura para cobrir sua intimidade.
É um grosseirão!
- Para mim tanto faz se você quer correr nu pelo mato, ou sei lá que outras coisas vocês selvagens fazem por aqui, mas enquanto estiver na minha presença, eu peço que use roupas!
Ele dá uma risada.
- A porta da rua é a serventia da casa, doutora.
- Seu tom é sarcástico e desperta meus instintos assassinos.
Se tem uma coisa que faz meu sangue ferver, é lidar com gente ignorante, e o cowboy peladão à minha frente é o rei dos idiotas.
- Essa casa também é minha - revido irritada.
- Na verdade, metade dessa fazenda é minha. Eu não vou
embora enquanto não chegarmos a um acordo.
Henrique agarra meus pulsos, e eu arregalo os olhos assustada.
- Então, parece que você veio para ficar.
Porque a minha decisão já está tomada - ele rosna, ficando a centímetros de distância.
Engulo minha indignação e me solto.
- É o que vamos ver!
Eu vou te dobrar, peão teimoso!
Eu me viro e retruco.
- Se eu fosse você, teria medo de andar nu, afinal de contas, com a quantidade de galinhas correndo solta por aí... elas podem confundir essa sua coisinha aí no meio das pernas com uma minhoca.
Ouço a porta bater com violência. Sufoco a risada. O equipamento do peão não tinha nada de pequeno, o cara estava muito bem servido, mas ele não precisava saber disso. Pelo visto, eu teria uma luta feia com esse peão. A imagem do corpo nu de Henrique me vem à mente mais uma vez, pego o papel na bolsa e volto a me abanar.
Sigo para a sala e sento-me no sofá coberto por uma manta cafona que parecia ter sido tricotada com restos de vários tecidos multicoloridos. Analiso tudo enrugando o nariz em uma careta de nojo, e então me sento. Preciso conversar com Matt. Digito furiosamente as últimas notícias.
Eu>> O cara é um bruto, acho que convencer essa criatura vai ser um pouco mais difícil do que eu imaginava.
Matt>> Por quê? Ele não tratou você mal, não é?
Eu>> Me deixou falando sozinha e depois ficou andando pelado na minha frente.
Uma pausa de meio minuto e a mensagem de Matt já tem outro tom.
Matt>> É bem dotado? Se tiver a oportunidade, tira uma foto. :)
Reviro os olhos e volto a digitar rapidamente.
Eu>> Isso não importa, o cara é um verdadeiro homem das cavernas, só faltou bater no peito como um brucutu marcando seu território. Ele me faz lembrar o Nick Batman, se isso responde sua pergunta.
O cacarejo de uma galinha voando sobre o sofá me fez saltar com a agilidade de uma ginasta.
Uma menina veio na direção da galinha em fuga, que batia as asas em desespero.
- Vem cá. - Ela dá o "bote" e pega o animal com rapidez, algo me diz que ela já está acostumada a fazer esse tipo de coisa. Minha santa Prada! O que eram os pés daquela garota? Estavam imundos, a roupa puída e seu corpo parecia já ter sido usado umas mil vezes.
- O que você vai fazer com ela? - pergunto.
- O almoço - explica como se aquilo fosse óbvio.
A garota de cabelos escorridos na altura dos ombros dá uma olhada para o chão, e eu faço o mesmo.
Ah, merda.
- Droga, droga, droga! - exclamo ao ver meu Iphone espalhado em partes miúdas pelo chão.
Não acredito nisso!
- Zira, pode ir ajudar com o almoço que a doutora já está de saída.
A voz de Henrique é autoritária. Zira? Isso lá é nome de gente. Pobre dessa menina, até que ela é bonitinha, talvez eu deixe algumas coisas minhas para ela quando eu me for, não quero nada que me lembre dessa fazenda.
Se esse cavalão falar nesse tom comigo, nem sei o que faço com ele.
Meu celular vibra no piso de madeira, um último suspiro antes da tela se apagar por completo.
Meu bebê. Me ajoelho no chão e junto os pedaços. A tela do pobrezinho está completamente destruída.
Não, eu não culpo a galinha voadora que estava fugindo pela vida, culpo o peão maldito que me fez ir até esse fim de mundo!
Henrique passou por mim e não se importar em desviar dos "restos mortais" de meu celular, pisoteando-o com aquela estúpida bota imunda. Ele deitou-se no sofá, apoiou os braços cruzados embaixo da cabeça e fechou os olhos, ignorando mais uma vez minha presença.Será que ele tem algum problema com roupas?
Bruto usava apenas um jeans e botas. Apesar da distância
entre nós, eu podia sentir o frescor do banho vindo de seu
corpo.
- O almoço vai demorar? - ele grita ainda de olhos fechados, como se eu nem estivesse ali.
- Mais uma hora - uma voz feminina vinda de um outro cômodo da casa responde, provavelmente da cozinha.
Enfio os cacos do meu celular na bolsa e levanto- me. Sinto pequenas gotas de suor se formarem em minha testa e algumas escorrerem por minha nuca. Meu olhar esquadrinha o território inimigo, fuzilando-o. Henrique tem o rosto másculo e a barba por fazer confere um ar rude com uma mistura de perigo, o nariz reto e a boca do tamanho exato, nem muito fina, nem muito grossa, o físico de um atleta, o peitoral largo, músculos definidos e queimados de sol, tive raiva de mim quando me peguei contando quantos gominhos haviam naquele abdômen até chegar em um belo V que, como Matt costuma dizer, é "o caminho da felicidade".- Vai ficar parada aí me olhando ou vai falar o que tem para dizer de uma vez!
O cara pode ser sexy, mas é um animal ignorante!
Reviro os olhos e me sento na poltrona de couro ao lado do sofá. Cruzo as pernas e solto o ar com força, reunindo meus argumentos para convencer esse fulaninho de que não adiantaria entrar em uma disputa comigo.
Henrique olha para minhas coxas e só então subo o olhar até meu rosto. Sinto o corpo aquecer de raiva e puxo a barra do vestido um pouco para baixo. Começo meu discurso
- Começamos com o pé esquerdo. - Tento uma
abordagem mais light. - Eu sei que se você ouvir o que
eu tenho a dizer, vamos chegar a um acordo.
O infeliz teve a coragem de voltar a fechar os olhos e colocar um dos braços sobre o rosto, como quem se prepara para dormir.
- Você vai ter o mínimo de educação e prestar atenção no que eu tenho a dizer ou vai ficar como uma criança com idade mental de cinco anos.
O peão não move um músculo sequer e ainda retruca:
- Eu escuto com as orelhas, e não com os olhos!
Bufo irritada com a patada e conto de trás para
frente, tentado manter a calma.
Mil, novecentos e noventa e nove...
- Eu não faço ideia do porquê deixou metade dessa fazenda para você, ele não deixou claro no testamento.
- Mais rápido, tô começando a ficar com sono
- Resmunga.
- Eu sei que você não me quer, e eu também não faço a mínima questão de ficar no meio do mato. Então, vamos ser diretos. Segunda-feira eu trarei uma pessoa para avaliar a fazenda, assim que tivermos um preço definido de quanto ela vale...
- Não! - ele rosna me interrompendo. - Não vou deixar que fiquem andando por aqui.
Henrique senta no sofá e posso ver que ele está tenso, cada músculo de seu corpo enrijecido.
- Preste atenção em uma coisa, doutora. Não pense que pode vir aqui cheia de vontades rebolando esse traseiro para me fazer aceitar qualquer coisa. Eu posso não ter tanto estudo quanto você, mas eu conheço muito bem o guizo de uma cobra.
Ahn? Ele me chamou de cobra?
- Não estou querendo enganar você, eu só quero o que é meu por direito - respondo ofendida.
- Você já tem minha palavra sobre a venda da fazenda. Eu nunca volto atrás!
- Mas metade de tudo isso é meu! Vou processá- lo e você vai acabar ficando sem nada, olhe bem onde está se metendo, Brandão!
Como um animal, ele se levanta e apoia os braços sobre as laterais da poltrona em que eu estou sentada. Seu hálito é fresco e cheira a hortelã.
- Não me ameace!
- Sua voz era perigosamente baixa e fez meu corpo estremecer.
- Eu sei tão bem quanto você que não podemos levar disputa para o tribunal. Eu não sou o burro ignorante que você pensa.
- Acredite, docinho, você não vai querer me ver brabo.
Rá! Se um peãozinho como ele está achando que vai me intimidar fácil, só pode estar louco.
Henrique fica de pé, e eu me levanto no mesmo instante, sentido o sangue ferver como lava incandescente correndo nas veias.
- Se você não quer sair, sou eu quem vai ficar!
- Respondo com voz firme e vou direto para o quarto, batendo a porta atrás de mim com o máximo de força que eu posso e logo a tranco com a chave.
Eu precisava de um banho para acalmar meu corpo e esfriar a cabeça. E a etapa seguinte seria fazer da vida desse peão um inferno...


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