#BRUTO - CAPÍTULO 8 - TRETA

05/03/2018

HENRIQUE BRANDÃO


Acordo com os gemidos de Carolina chamando meu nome. Ela está sonhando comigo, eu tenho certeza. Diabo de mulher teimosa, o quanto antes ela fosse embora, seria melhor, o problema é que ela é tão teimosa quanto uma mula empacada.
Levanto da cama, é a primeira vez em anos que eu quebro minha rotina secreta durante a madrugada. Isso não poderia mais acontecer. Me visto, calço as botas e vou para a cozinha. Como o pão com uma xícara de café requentado. Junto as comidas dos potes e as frutas da geladeira.
Vamos ver quanto tempo a doutora aguenta sem comida.
Dou a mistura aos porcos.
- Dia, patrão! - O irmão mais velho de Zira me cumprimenta quando me vê encilhando Moa.
- Dia! E aí, nasceu o bezerrinho? - Afivelo a sela e monto para guiar as vacas para o pasto.
- Ainda não fui ao celeiro.
Encho os pulmões e toco o berrante, dando inícioà rotina na fazenda.
- Então, bora lá, folgado - À distância, vejo que Carolina me observa pela janela do meu quarto. Pisco um olho sabendo que isso irá irritá-la.Cutuco, com os calcanhares das botas, a égua,que já acelera o trote.
- Tô falando, Silas, aquela mulher é osso duro,cheia de não me toques, deve ter nojo até da sombra.
- E se ela quiser ficar na fazenda? - Ele tinha preocupação na voz. - E se quiser nos expulsar? A fazenda era imensa e havia mais cinco famílias que trabalhavam ali, plantando, ajudando com a colheita,tratando os animais.
- Já disse que ninguém vai ser expulso daqui.
Eu dei minha palavra, não dei? Jogo sobre o ombro um saco de ração de quase vinte quilos e o carrego até o celeiro para distribuir aos animais.
- Você tinha que ver a cara da dondoca ontem na hora do almoço.
Silas escova a crina de Moa e dá uma risada.
- O senhor falou na doutora a manhã inteira.
- Claro, aquela mulher me atormenta. Mas logo-logo vai achar o caminho de volta para casa.
Lembro-me de seus saltos afundando no barro nodia anterior.
- Esse lugar não é para ela.
- Sei, sei. Isso está parecendo outra coisa. Moa relincha. Largo o pesado saco no chão e o xingo.
- Não fale besteira, peão. Apesar daquele corpo, a mulher é só incomodação. Volto para o chalé perto do meio dia, trazendo uma marmita de comida da casa de Zira.
Há um carro de luxo estacionado em frente à casa. Empurro a porta de madeira e ouço risadas vindasdos fundos da casa.
Mas o que essa potranca havia feito?! Tudo ali estava diferente. Uma manta dourada substituía a antiga que cobria os furos do sofá. Fui para meu quarto e, sobre a cama, uma colcha florida colorida combinando com uma porção de travesseiros e almofadas.
Que porra era aquela?
A risada da diaba se torna mais alta.
- Para Matt.
Matt? Quem é esse?
Pisando duro, eu fui até eles.
Carolina usava um longo vestido cinza que ia até o chão, o decote deixava seus peitos muito gostosos. Ela riu de forma descontraída quando ele a beliscou na cintura enquanto retirava os pratos sujos. Pigarreio, interrompendo a palhaçada. O homem usando terno me olha, assim que ela percebe minha presença, bufa e revira os olhos.
- Henrique, esse é o doutor Luís Pauvolih.
O mauricinho fica de pé, temos a mesma altura.
Ele estende a mão para me cumprimentar.
- É um prazer.
Olho para a mão suspensa e não o cumprimento.
- Fico feliz que esteja cuidando da minha
garota. Ela mencionou algo sobre os sanguessugas.
- Ela também falou que dormiu comigo noite
passada?
Chego mais perto da mesa, pego uma das coxasassadas e a mordo.
- Hum... quem diria que a doutora sabe cozinhar
- Retruco de boca cheia.
Afasto-me e posso ouvi-la bufar e se explicar.
Volto para sala e deito no sofá esticando as botasembarradas sobre as almofadas novas.
Ouço as batidas dos saltos se aproximando. E lávem a fera.
- Primeiro: quem deixou você se servir da
comida que EU comprei? Segundo: que merda foi aquelade destratar o meu namorado e dizer que nós dormimosjuntos? Terceiro: tire a porcaria dessas botas fedorentas de bosta de vaca das minhas almofadas.
Ela está parada diante de mim com as mãos apoiadas na cintura. Coloco meu chapéu sobre a cara e fico de olhos fechados, podia ouvir cada respiração furiosa.
- Quer olhar para mim quando eu falo você, seu Brucutu!
Com um safanão, ela arranca o chapéu, arremessando-o longe.
Peste de mulher.
Fico de pé sentindo a irritação crescendo violentamente.
- Você está mexendo com fogo, potranca - rosno. - Eu faço o que eu bem quiser nessa casa. Se não está satisfeita com a hospitalidade da fazenda, aproveite que o seu namoradinho fru-fru está aqui e já pega uma carona de volta para a casa.
- O que está acontecendo aqui? - A voz dele éfirme.
- Sua namorada está dando chilique porque eufalei que nós dormimos juntos noite passada.
Ela grunhe furiosa.
- E hoje de manhã eu acordei com ela gemendo alto... - Afino a voz para arremedá-la. - Isso, Henrique... Não para.
Carolina me enfrentou, estapeando meu peito e me arranhando como uma gata furiosa, mas o tal de Luís a puxou para trás, agarrando-a pelos braços.
- Eu sei o que você está fazendo, peão. Isso não vai dar certo! - ela berra.
- Calma, Carol, deixa que eu lido com isso - ouço ele sussurrar ao seu ouvido.
- Para, Luís! - ela ralha. - Não preciso que
nenhum homem me defenda.
- Claro que não. - retruco. - Pelo visto, você é mais macho que esse seu homem.
Luís se coloca na frente dela, e eu sorrio em deboche enquanto estalo os dedos quando fecho os punhos.
- É bom tratar a Carolina com respeito, ou...
- Ou o quê? - eu o interrompo, dando um passo à frente.
- Para, Matt! Henrique, se você encostar nele, você vai se ver comigo! Carolina o puxou para o quarto com alguma dificuldade, apesar de resistir, ele a seguiu.
- Veado - resmungo e recolho meu chapéu do chão.
Com o sangue borbulhando nas veias, vou para fora do chalé e pego a machadinha presa em um tronco.
Ergo no alto da cabeça e desço a lâmina com força, partindo o toco de madeira ao meio. Repito o movimento sem parar, triturando tudo, deixando que a raiva saia de mim aos poucos, a cada machada golpeada contra as toras de madeira.
Ouço risadas da doutora, ela aparece na porta com o namorado.
Bufo e continuo o que estou fazendo, tentando ignorar o fato de que eles estão a poucos metros de mim. Ele se deita na minha rede e a puxa para o colo. Na. Minha. Rede. Isso vai ter troco. Com o suor escorrendo pelo corpo, eu apoio a perna em um pedaço de madeira e grito.
- Essa rede não vai aguentar esse peso todo.
A peste finge que nem me ouviu. Volto a cortar os troncos, mas ainda posso ouvi-los.
- Matt! Você disse que tinha parado! - De rabo de olho, vejo o que estão fazendo. O playboy está com um cigarro pendurado na boca.
- Eu não vou acender - se justifica, passando as mãos nos cabelos fartos da doutora.
- Não vai mesmo, ou eu queimo você com ele.
Ele dá uma risada.
- Você sabe que eu não tolero nenhum tipo de droga, meus pais sempre foram muito rígidos quanto a isso.
- Eu sei, eu sei.
Após algum tempo, sinto os músculos dos meus braços e peito queimando pelo esforço.
- Tenho que ir embora. Já está tarde, vou tentar pegar um voo noturno de volta para São Paulo. Tem certeza que não quer voltar comigo? - Enquanto fala, ele enrosca os dedos acariciando uma mecha do cabelo de Carolina.
- Você sabe que eu só vou embora quando essas terras forem vendidas. Não precisa ficar preocupado comigo. Espero que consiga vir no próximo final de semana.
Ele dá um beijo no topo de sua cabeça, e ela se levanta para que ele possa ir.
- Eu também espero - responde com carinho.
Largo o machado e vou até o galinheiro buscar alguns ovos. Ouço o ronco do motor. O engomadinho já devia ter ido embora. Quando volto para dentro do chalé, Carolina está deitada no sofá, o vestido longo agora
erguido até a altura das coxas, ela apontava o controle para uma televisão fina e pulava de um canal para o outro.
- O sinal daqui é péssimo.
- Ainda dá tempo de correr atrás do seu namorado e voltar com ele.
Vou para a cozinha e, com os ovos recém recolhidos, preparo uma omelete com linguiça. Sirvo um prato e pego uma garrafa de cerveja no fundo da geladeira.
Sento na poltrona e começo a comer.
- Argh, peão! Ao menos podia ter tomado um banho. 
- Ela abana o ar e faz uma careta de nojo.
Largo a colher no prato. E pergunto ainda de boca cheia:
- Meu corpo suado incomoda você?
Ela revira os olhos e desliga a televisão.
- Lógico! Tudo em você me irrita!
Dou mais uma colherada na omelete e respondo:
- Ótimo!
Depois de comer e tomar uma ducha rápida, visto roupas limpas e pego meu chapéu. Ela abaixa o livro que cobre seu rosto e deixa apenas os olhos à mostra.
- Onde você vai?
- Sair.
Carolina senta no sofá e larga o livro sobre as almofadas.
- Isso é óbvio! - ela retruca impaciente. - Estou perguntando ONDE?
- No rufião.
- Rufi o quê? - Ela arqueia apenas uma sobrancelha.
- Um bar na cidade.
Ela salta do sofá e corre para o quarto. Segundos depois, aparece com uma bolsa tiracolo e tamancos altos quase da mesma cor da bolsa.
- Podemos ir. - Passa por mim rebolando o belo traseiro.
- Não, você não vai comigo - rosno, enfiando a camisa para dentro da calça.
- Ah, Henrique, seu saco não vai cair se me deruma carona até lá.
- Carona? Eu vou a cavalo.
Ela fica poucos segundos calada e continua firme em sua decisão.
- Então, vamos de uma vez, peão.
Diacho de mulher teimosa.
Moa ainda está encilhada, calço o pé no estribo e impulsiono o corpo, montando a égua. Carolina faz uma careta de nojo e ergue um pouco o vestido para conseguir movimentar a perna.
- Vamos, mulher. Deixe de ser fresca! - Percoa paciência. - Me dá essa mão que eu puxo você.
- Esse seu ar de gentleman inglês me encanta cada dia mais - Ela debocha.
Desengonçada, ela consegue, com custo, montar a égua. Pego suas mãos pequenas e a faço segurar em minha cintura.
- Segure firme.
Cutucando Moa, ela inicia o trote leve e, no mesmo instante, a doutora se agarra com força. Sinto seus peitos macios, pressionados contra minhas costas.
Sinto meu pau ficando duro.
- Como chacoalha. - ela reclama ao meu ouvido.
- É porque é um cavalo, e não um carro de luxo.
- Respondo com rispidez.
Prendo Moa no poste em frente ao rufião.
- Meu Deus, que espelunca é essa? - ela diz baixinho, com desdém na voz.
Dou uma beliscada em seu traseiro, é mais forte do que eu, ele atrai minha mão como um ímã.
-Tinha uma folha seca grudada. - Minto sem conter uma risada.
Ela dá um pisão no meu pé e sai pisando duro para dentro do bar. Diaba de potranca gostosa. Ajeito o chapéu na cabeça e sigo para o Rufião. No balcão, a doutora enfezada conversa com Cátia que lhe serve um martelinho de aguardente.
Antes de beber, ela aproxima o pequeno copo do nariz e cheira a bebida.
- É melhor ir com cuidado aí, doutora. Se você
estiver toda vomitada, não vou carregá-la de volta para casa.
Cátia dá uma risadinha e limpa o balcão de vidro com um pano cheirando a álcool.
- Vá se ferrar, peão!
- Uia... essa é das brabas - Cátia provoca.
- Ricoooo - Aquela eram as vozes das loiras
que comi alguns dias antes.
Carolina revira os olhos e vai dançar na pista.
- Boa noite, moças - cumprimento sem tirar os olhos da doutora.
Ela percebe que estou olhando, mostra o dedo do meio e vira de costas, ainda rebolando no embalo da música sertaneja que ecoa pelas paredes do rufião.
- Dois martelinhos - peço a Cátia.
As loiras riem e cada uma se engancha em meus braços.
- Nós não bebemos cachaça.
Eu a encaro.
- E quem disse que é para vocês?
Viro um seguido do outro e puxo as loiras para a pista.
Felipe, o irmão de Cátia, dança perto de nós sem tirar os olhos de Carolina.
Essa noite vai ser fogo......


CONTINUA...
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