BRUTO - CAPÍTULO 12 - Vingança

06/03/2018

Henrique Brandão
A doutora demorou uma semana para falar comigo, ou melhor, para falar com o Silas. Ela ainda não está falando comigo. Dou uma risadinha, como se ficar sem ouvir seus xingamentos e patadas fosse um grande castigo, o silêncio no chalé é uma benção. Eu e Silas bebíamos um café preto quando ela apareceu na varanda.- Seu nome é Silas, certo? O peão balança a cabeça e me dá uma olhada rápida, como se pedisse permissão para conversar com a diaba.- Sim, senhora. - Ele tira o chapéu e coloca sobre a mesa.- Preciso de umas aulas de equitação.Ele franze o cenho. - Equita o quê?Ela revira os olhos e sorri, fazendo pouco caso da burrice do peão, mas eu também não sabia que diabo a potranca estava falando.- Quero que você me dê umas aulas de montaria.Silas me olhou mais uma vez. - Posso, patrão?Eu jogo o corpo para trás e me escoro na cadeira.- Você não precisa pedir permissão a ele. Sou sua patroa também. E caso ELE não tenha dito, essa fazenda é tão minha quanto dele.Silas suspira sem saber como reagir diante da patada da potranca.- Sim, senhora. Me desculpe.Pobre homem, vai comer o pão que o diabo amassou.- Eu posso ensinar. Monto desde guri. Ela me dá um olhar furioso.- E alguém chamou você na conversa, seu brucutu?! Recolha-se à sua insignificância.O primeiro coice direcionado a mim em uma semana. Não pude deixar de rir da língua afiada da diaba.Claro que eu tinha uma utilidade muito melhor para aquela boca. Carolina usa uma calça preta tão colada nas coxas que parece não estar usando nada, usa uma blusa folgada, mas com um generoso decote. Meu pau lateja na calça, e eu tenho que me ajeitar na cadeira por causa de minha ereção.- É para hoje, Silas. - Ela ignora meu olhar e apressa o peão.Ele se levanta e a segue para fora da casa. Isso vai ser engraçado. Eu sento debaixo da sombra de uma mangueira e olho a cena. A cara de nojo da doutora não tem preço. Não é que a peste ainda está de salto. Posso ouvir Silas a ensinando os comandos básicos. Talvez, o primeiro pinote que o cavalo desse, a assustasse o suficiente para que ela voltasse para São Paulo. Desajeitada e com corpo mole, ela firma o pé no estribo. Silas tenta empurrar a peste pelo quadril para que ela passasse a perna sobre o cavalo.- Não seja abusado ou o demito! - ela grita.- Não, senhora. - Ele se desculpa sem saber como ajudar. Eu me aproximo e toco no ombro de Silas, que sua de nervoso.- Deixa que eu lido com a fera.Ela range os dentes e me lança um olhar furioso, ainda com metade do corpo trepado ao cavalo.- Fera é a sua bunda! - ela xinga.- Calma, doutora, estava me referindo ao cavalo, o nome dele é Fera. - Minto. Eu estava falando dela mesmo. Silas aproveita a deixa e vai cuidar de uma das cabras que escapou.- Segure com força na sela e deixe essa perna dura. - Eu passo a mão por sua coxa, diacho de mulher gostosa. Minha mão aperta de leve sua coxa grossa.Ela não me chuta, senão cairia do cavalo.- Quer parar?! - rosna.Eu rio. - Estou com a melhor das intenções, doutora - provoco. - Ou você não quer aprender com o melhor? Com a outra mão, acaricio a coxa enquanto a empurro para que fique montada e dou uma apalpada, porque não sou de ferro, aquela bunda, a calça colada. São um convite.- Eu consegui! - ela grita ofegante.- Na verdade, eu empurrei sua bunda para cima, porque você estava empacada. - A corrijo com um sorriso no rosto, o olhar preso na alça de sua blusa caída pelo ombro. Ela me fulmina com o olhar.- Você é um ogro, sabia? Nunca conheci alguém que sentisse prazer em ser desagradável.- A doutora também não é a simpatia em pessoa - respondo, pegando sua mão e posicionando sobre as rédeas. Suas mãozinhas são pequenas e macias em comparação as minhas.- Segure assim - explico, apesar de contrariada, eu tenho sua atenção. - Não interessa o que tenha visto nos filmes não bata os pés aqui.Aponto para o espaço entre a barriga e as patas traseiras.- Por quê? - ela retruca.- Se fizer isso, ele vai sair em disparada.- HUM... - ela murmura olhando para o horizonte.Eu continuo ensinando. - Para virar para o lado, puxa de leve esselado, para virar para o outro, a mesma coisa.- E para parar? - Carolina me interrompe.- Puxe as duas cordas, mas não com muita força. - Eu passo a mão pela crina negra do cavalo. -Acho melhor eu montar atrás de você só para você pegar o jeito.A diaba revira os olhos e diz com desdém: - Sei o que você quer, pode tirar o seu cavalinho da chuva, você não vai ficar se esfregando na minha bunda. - Ela cutuca a barriga do cavalo com os calcanhares. - E agora, saia da frente que eu quero cavalgar.Ahhh, mulher geniosa. Acerto um tapa na bunda do cavalo e o animal inicia um galope seguido de um relincho alto.- Filho da mãe - ela grita.Gargalho quando vejo o corpo dela quicando sobre o cavalo. Corro para o celeiro e monto na Moa, que não está encilha, subo direto no pelo e me agarro em suas crinas cor de fogo.- Henriqueeeeeeeeeee - ela grita à distância.Moa inicia um trote que logo se transforma em galope.- Gostando, doutora? Cavalgo ao lado dela.- Co-mo é que pa-ro es-sa co-i-sa? - A pergunta sai tremida.- Puxe a corda devagar! - grito.Ela o faz. Porém, não devagar. O cavalo relincha e ergue as patas da frente em um pinote violento.Carolina perde as rédeas do animal.- Ahhhhhhh, meu Deus, eu vou morrer - ela grita pendurada pelos pés.- Se agarre na sela, mulher - ordeno quando a situação sai de controle.Solto as crinas de Moa e me seguro apenas com as pernas.- Henriqueeeeee! - ela berra histérica.- Aguente firme, potranca. Pulo para o cavalo em que ela está pendurada.Com uma mão, seguro as rédeas e com a outra, a puxo de volta para cima. Ela se agarra em meu peito e se segura com força, cravando as unhas em minha pele. Cavalgamos de volta para a fazenda. Seu coração bate tão acelerado no peito que eu posso sentir suas batidas se misturando às minhas.- Silas, vá atrás da Moa, deixa que eu cuido desse aqui. - Aviso enquanto desço do cavalo. Coloco as mãos em torno de sua cintura macia e a puxo para baixo. Carolina se agarra em meu corpo quando está prestes a perder o equilíbrio. - Calma, mulher - digo, agarrando-a para que não desabe.Mas é claro que eu esqueço que pedir calma a uma mulher nervosa é como dizer "capeta, eu o invoco, mostre seu poder".- Calma? - ela diz indignada. - Eu poderia ter morrido.Quando percebe que ainda está agarrada ao meu corpo, ela grunhe furiosa.- Meu Deus, você não vale nada. - Ela empurra meu peito e sai pisando sem muita firmeza para dentro de casa.Que aquela mulher gostosa era obstinada, isso eu já sabia, mas depois do susto daquela tarde, achei que apeste nunca mais chegaria perto de um cavalo na vida. Por isso, me surpreendi. No dia seguinte, ela apareceu no celeiro com uma calça tão colada quanto a outra e uma blusa cor de rosa.Ela calçava tênis, era a primeira vez que eu a via sem aqueles tamancos por livre e espontânea vontade.- Ué? O que aconteceu com, - afino a voz para arremedá-la. - "EU. Nunca desço do salto".- Vá se ferrar, peão - ela esbraveja. - E me traz o Bruto que eu quero montar de novo.- Bruto? - Dou uma risada.- É, aquele cavalo de ontem, vou montar aquele cavalão.Dou uma risada sacana.- Bruto é mais apropriado que Fera - ela resmunga.- Já posso imaginar você cavalgando no Bruto.- Mas eu não me referia ao cavalo e, pela careta de raiva que ela faz, ela entendeu ao que eu me referia. Todos os dias, no mesmo horário, ela cavalgava, e até que a doutora pegava o jeito. No sábado, ela já não precisava mais de ajuda para subir no cavalo redomão.- Silas, quero que mantenha esse cavalo encilhado para mim.Já faz duas semanas que aquela peste de mulher teimosa estava ali, contrariando tudo, não tinha luxo, nem mesmo água quente para seus longos banhos. Carolina ficava por perto com seu narizinho empinado, como se estivesse inspecionando cada movimento meu e dos outros trabalhadores. O que mais eu teria que fazer para colocar essa praga para correr?- Silas, trate de deixar os animais limpos e a estrebaria também, chame os outros peões para ajudar a organizar o celeiro. Fiquei sabendo que o fiscal da vigilância sanitária está passando pelas fazendas da região. Quero tudo dentro dos conformes.Naquele sábado, não vi Carolina o dia inteiro.Estranhei seu sumiço. Aquela mulher silenciosa era encrenca na certa.- Você viu onde a doutora foi? - perguntei a Silas, que terminava de escovar a crina do último cavalo.- Não, patrão. Ela montou no Bruto e não disse para onde ia.Passo a mão pela barba cerrada, tentando imaginar o que aquela potranca estaria tramando. Carolina volta pouco antes do entardecer alegre como um passarinho.- Aonde foi?- Não te interessa - ela resmunga, perdendo seu humor em segundos.- Aqui temos muitos animais selvagens, doutora, mandei alguns peões atrás de você pela fazenda, achando que já tinha até batido as botas devorada por uma surucucu.Ela para na porta do quarto e arqueia apenas uma sobrancelha.- Não que seja da sua conta, mas eu fui passar o dia com o meu namorado. E foi bom demais.A peste vai para o banho.- Ai, que delícia de água - ela provoca.Me viro na cama e fecho os olhos tentando dormir. O chuveiro é desligado. Do banheiro, emana uma nuvem de perfume, logo ela para na porta usando uma camisola curta preta que mal cobre suas partes.Peste provocadora!Ela desfila pelo quarto e deita ao meu lado. Sinto endurecer na hora. A potranca vira de lado e dorme com a bunda virada para mim. Mulher você está brincando com fogo. Bufo.
*É domingo e, pela primeira vez em dias, perco a hora. O lado em que ela estava deitada já está vazio. Estranho. Ela nunca levanta cedo. Procuro minha calça e não a encontro sobre a cadeira no canto do quarto.- Carolina! - rujo furioso quando vejo o que a diaba fez com meu chapéu.Arruinado!Com a ponta dos dedos, ergo o chapéu que agora terá que ir para o lixo, ela o cobriu com algum tipo de brilho dourado, por dentro e por fora.Vou até a cômoda, mas não há uma muda de roupa, na cama há um lençol que eu possa me enrolar.- Carolinaaaaaaaaaaaa!- Vem aqui na rua, peão! - Em sua voz, uma pontada de diversão.Quando eu puser minhas mãos em você... Nu, coloco as mãos na frente do pau e sigo a voz da peste e o som de suas risadas. Filha duma égua!Todas as minhas roupas, calças, camisas e cuecas foram tingidas de rosa, não um rosa qualquer, era a porra de um rosa berrante.- Gostou? - ela gritou trepada no galho da alta mangueira. - Acho que a cor combina com seus olhos.- Uma hora ou outra você vai ter que descer daí de cima, e eu vou estar esperando, potranca.Ela riu, a peste não tinha medo de nada!- Ah, brucutu... por que você não vai até o celeiro ver a decoração de eu fiz para você com todo amor e carinho?Descalço e caminho nu para ver o que mais a diaba tinha aprontado. Nem precisei chegar muito perto para ver as flores pintadas em rosa nas paredes de madeira.Henrica!Ela levara a noite toda arruinando tudo. Manchas rosas espalhadas pelo interior do celeiro, ela não tinha deixado escapar uma tábua sequer.Ela pintara até o pelo das ovelhas! Peste!Ela cortara as crinas dos cavalos e os manchou de rosa. Aquela doida só podia estar com o diabo no corpo, não, ela era o diabo encarnado.
CONTINUA...
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